
"Há coisas neste mundo que são assim porque é assim que devem ser. Há outras, no entanto, que são antinaturais e que a pesar disso triunfaram e se disseminaram entre nós como verdades. Essas práticas aprendidas disfarçadas de moral, mas carregadas de preconceito, conseguiram expulsar o ser humano do aconchego da floresta onde habitava imaculado, pacífico e selvagem. Expulsos do paraíso, sem intuição e vidência, as novas criaturas solitárias e agressivas foram forçadas a dissimular qualquer resquício natural e todo atavismo gregário que as vinculasse à floresta do mundo natural.
Nessa nova cultura da sobrevivência foi a mulher, talvez por ser a criatura mais brilhante, quem teve que sofrer as maiores privações. Proibida, silenciada, torturada e rotulada pela violência e ignorância dos homens, foi ao longo da historia da humanidade quem mais teve que disfarçar e submeter ao silêncio as potentes vozes dos mundos subterrâneos que nela habitam. São as mesmas vozes interiores que no homem há muito tempo se calaram, emudecidas por essas falsas verdades que, em vigor, provocaram as atuais relações de servidão cultural e as rígidas, antagônicas e simplistas estruturas dentro das quais foram enclausuradas toda a pluralidade e complexidade do universo da mulher.
Superada a época da submissão, esses ritmos interiores, selvagens e exuberantes de criação e talento, ainda são capazes de fertilizar a aridez do mundo conhecido reconstruindo o caminho de volta rumo à mítica floresta. Esse será o provável retorno ao reino natural e à gênese da intuição. Será o caminho que nos levará à pátria psíquica e, esquecidas as penúrias do desterro e as distancias que um dia nos separaram, emergirá da natureza o rosto de deus como no princípio era visto."
Clarissa Pinkola Estes
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